Mapa do Mali, onde as tropas francesas realizam seu oitavo
dia de operação para combater grupos radicais islâmicos.
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Em janeiro, radicais islâmicos fizeram um número ainda indeterminado de reféns de pelo menos dez nacionalidades no campo de gás, de In Amenas, no leste da Argélia, próximo da fronteira com a Líbia, para exigir o fim da operação militar francesa no Mali, que já dura oito dias. O local explorado pela petrolífera britânica BP, pela norueguesa Statoil e a argelina Sonatrach foi invadido por membros do grupo radical islâmico al-Mulathamin fortemente armados, que detiveram parte dos funcionários presentes. Na quinta-feira, o exército da Argélia cercou e atacou a área para libertar os sequestrados. A operação de resgate lançada pelos argelinos, sem a participação dos países de origem de parte dos reféns, foi alvo de críticas da comunidade internacional e provocou a morte de um número ainda incerto de pessoas. A primeira informação da segurança argelina indica que 639 dos sequestrados foram liberados, entre eles 66 estrangeiros, mas a operação militar ainda não foi concluída.
Por que o Mali é palco de conflito armado?
O país da Africa do Oeste, possui 12 milhões de habitantes em um território duas vezes maior que o da França. A região sul do país, que gira em torno da capital Bamako, é conhecida como o “Mali verde”, devido à abundante presença de vegetação em torno do rio Niger. É nessa área que estão concentradas 90% da população do país, majoritariamente composta por negros. O norte fica em parte no Sahel, faixa territorial de transição entre as savanas subsaarianas e o deserto, e a outra parte integra a maior zona desértica do mundo, o Saara. Essa região árida e pouco habitada chamada de Azawad é ocupada por uma minoria de árabes e tuaregues, povo de origem nômade. Desde a criação da República do Mali, com o fim da colonização francesa em 1960, um movimento separatista reivindica a independência da região. Mas a zona de ocupação dos tuaregues ultrapassa as fronteiras do Mali, entrando na Argélia, no Niger e na Líbia. Pouco controlada pelo Estado, a região norte do país é um corredor de passagem para o tráfico de pessoas, armas e drogas.
Quais as milícias que atuam na região?
Parte do Saara, o Sahel e especificamente o norte do Mali constituem a área de ação da Aqmi, Al Qaeda para o Magrebe Islâmico. O grupo radical islâmico, braço africano do grupo terrorista Al Qaeda, já executou mais de 80 sequestros na região desde 2007. Com a queda do governo de Muammar Kadafi, após a entrada das forças da Otan, Organização do Tratado do Atlântico Norte, na Líbia em 2011, as tropas tuaregues, antes engajadas pelo ex-governo líbio, retornaram para a região desértica da Azawad, no norte do Mali, fortalecidos e com novas armas. O movimento de liberação da região chamado de “rebelião tuaregue” ou “guerra de Azawad”, existente desde a independência do Mali, é reativado com a fusão do Movimento Nacional do Azawad (MNA) e o grupo armado Movimento Tuaregue do Norte do Mali (MTNM) criando o Movimento de liberação da Azawad (MNLA), que ataca o mal equipado exército malinês. O ataque ao campo de gás em retaliação à entrada das tropas francesa no território malinês foi executado pelo grupo al-Mulathamin, dirigido por Mokhtar Bel Mokhtar, ex-chefe da Aqmi.
Como aconteceu a intervenção francesa?
Em 22 de março de 2012, o exército depois de diversas derrotas para as forças radicais islâmicas decide derrubar o governo do presidente do Mali, Amadou Touré. Em abril, o MNLA declara a independência do Azawad. Além do grupo separatista, luta ao seu lado a milícia tuaregue, Ansar Dine (Defensores do Islã), que defende o islamismo radical e quer impor a charia, lei islâmica, à população local. Os dois entraram em conflito pela administração da área. O governo enfraquecido do Mali e a crescente instabilidade da zona permitem a expansão do poder de grupos radicais islâmicos armados, como o Movimento pela unidade e pela Jihad na Africa do Oeste (Mujao).
Os países vizinhos, Burkina Faso, Mauritânia, Niger e Argélia recebem o fluxo de refugiados do Mali, 150 mil pessoas no último ano, segundo dados da ONU, e começam a se preocupar com o risco de contágio do conflito. O número de pessoas que estão deixando o norte do Mali em direção a outras localidades dentro do próprio país chega a 230 mil.
No dia 10 de janeiro de 2013, os rebeldes ultrapassam a linha invisível que divide o norte e o sul do país, com a tomada da cidade de Konna, e seguem a rota em direção a capital malinesa. A ação desencadeia no dia seguinte a intervenção militar francesa, a pedido do governo interino do Mali. A operação “Serval” obteve o acordo do Conselho de Segurança da ONU e da Comunidade Econômica de Estados da Africa do Oeste (Cedeao).
No Mali, as tropas francesas realizam o seu oitavo dia da intervenção, que conta com a colaboração de tropas africanas e com o apoio logístico da aviação americana, espanhola e alemã. Na quinta-feira a União Europeia aprovou o enviou de 450 militares, dentre eles 200 instrutores, a partir de fevereiro. O projeto vai custar 12 milhões de euros e tem duração inicial de 15 meses. Já as tropas da Cedeao também são esperadas, a partir da próxima semana, para reforçar o combate contra os radicais islâmicos.
Por que a Argélia é importante no conflito?
Maior potência regional e o maior país africano em extensão de território, a ex-colônia francesa possui 35 milhões de habitantes. Situada estrategicamente no coração do Magrebe, entre a Tunísia, o Marrocos, seu principal rival na hegemonia regional, e a Líbia, palco da última invasão das forças da Otan, lideradas pela França, Inglaterra e Estados Unidos, para lutar contra as tropas do ditador Kadafi, que dirigiu o país por mais de 40 anos. Oitavo produtor mundial de gás natural, essa atividade junto com o petróleo representa 49% das exportações do país.
A Argélia possui mais de 1.300km de uma fronteira porosa com o Mali, em pleno deserto, e é o único país da região que não apoiou a operação militar francesa em seu vizinho. O governo do presidente argelino, Abdelaziz Bouteflika, permitiu apenas que caças da aeronáutica francesa sobrevoassem seu território para ter acesso às zonas de conflito. O país foi palco de diversos atentados recentes. Na cidade de Tamanrasset, no sul da Argélia, foi criado o centro de gestão do mecanismo criado por cinco países para combater o terrorismo no Sahel.
Reportagem por: Luiza Duarte
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